Marceneirando por paixão

Marceneirando por paixão

Tiago Gigli

Já parou para pensar no quanto algumas coisas que fazemos tem um valor nostálgico? As músicas que ouvimos ou os filmes que consideramos clássicos são exemplos. Algumas dessas coisas nos acompanham durante toda a vida, enquanto outras ficam adormecidas e acabam reaparecendo em algum momento mais tarde, trazendo lembranças tão boas…

Sempre flertei com a marcenaria. Há uns 10 anos atrás comprei uma tico-tico e uma furadeira e fiz uma caixa de areia pro meu filho. Coisa simples com 4 pedaços de caibro parafusados entre si, só para fazer a contenção. Sabe o cheiro da madeira quando ela esquenta por conta da broca que grita ao perfurá-la. Cada madeira tem um cheiro, tem um peso, uma textura. Aquilo mexeu comigo, mas deixei adormecer essa paixão.

Alguns anos depois, mudei-me para o litoral de SC e lá consegui alguns pallets. Eu estava numa fase de recuperação de um ano de desemprego, sem condições de comprar nada.Ganhei os pallets e um colchão de solteiro. Eu amava aquilo. Era meu lego de adulto. Não fiz grandes coisas, mas me inspirava algo que eu não sabia o que era.
Meu pai se orgulhava de ser autodidata. Aprendia vendo as pessoas, perguntando aqui e ali. Ele sabia muitas coisas, muitas mesmo! Ele fazia qualquer coisa que dessem na mão dele. De eletrônica, elétrica, hidráulica e marcenaria. O meu avô era alfaiate e seus irmãos marceneiros. Lembro-me de um formão muito antigo que meu pai tinha em casa. Ele adorava pegar madeira na rua e transformar em bancadas, aparadores, quadro de ferramentas, expositores da oficina de eletrodomésticos que ele tinha. Era cada coisa incrível que ele fazia e eu, criança, apesar de nunca me dar conta do valor daquilo, percebia o orgulho que ele sentia quando me mostrava seus feitos. Ele não está mais aqui; se foi há uns dez anos.

Eu trabalho com TI desde meus treze anos, mas gosto de pôr a mão na massa. Amo fazer as coisas com as mãos. Papel, comida, costura e agora madeira.
Há alguns meses comecei a personalizar a casa. O home-office me deu tempo pra olhar pra ela e pensar em como poderíamos, meus filhos e eu, nos sentir mais conectados com o nosso lar. Então, seu Mário (meu pai) me sussurrou que tudo que eu faço com as minhas próprias mãos tem um pouco de mim.
Comecei com uma estante de pinus que achei em promoção numa dessas lojas de bricolagem que costumo ir comprar alguma coisa para casa por pretexto, só para ficar namorando as coisas. Montei ela em casa, com uma parafusadeira. Logo comprei outra porque achei charmosa mas pensei em serrar com a tico-tico e deixar-la mais baixa para colocar no banheiro. Nossa, que sensação incrível de serrar algo. Aquele cheiro novamente!

 

 

Meu sofá já era feito de pallets aqui onde moro agora. Charme legado do outro apartamento.

Então pensei em colocar umas plantas por aqui e dar mais vida, até que percebi que precisava de lugar para essas plantas que eu já havia comprado. Uma prateleira ali, um mancebo de parede aqui. Poxa! O prazer de fazer essas coisas foram me empolgando demais. A casa começou a ter aquele charme e em cada coisa nova que eu inventava tinha um pouco de mim. Eu pensei, planejei, criei e executei. Isso reflete tão bem o momento que eu estou vivendo, de pensar, planejar, criar e executar minha própria vida. Então precisei de uma mesa de trabalho, e criei. Queria uma prateleira onde pudesse colocar uns vasos e tirar um espaço em branco da sala, mas não queria algo comum. Fiz então uma prateleira fixada no teto. Caramba, que trabalho que deu. Na visita a loja descobri a tal eletrofita. Minha prateleira virou uma luminária com vasos. Ficou incrível! Com pouca grana consegui criar algo único, que não tem no pinterest, nem vende por aí. É exclusividade minha. Depois pensei em montar uma bancada de trabalho retrátil para que meus filhos possam ficar nos computadores na sala, comigo, e que no final de semana eu possa mover ela e transformar em encosto de um segundo sofá e receber meus amigos para tomar um vinho comigo e admirar a decoração.

 

 

Então eu olho pra tudo isso e vejo como eu sou criativo. Como meu pai é uma inspiração para mim e me ensinou tantas coisas que eu vejo agora aplicadas nas minhas criações. Sinto o quanto é gostoso dividir com meus filhos adolescentes essas criações, discutir com eles o projeto e ter um pouco de nós em cada uma dessas coisas.
A cada projeto uma porção de coisas não ficaram tão boas quanto eu gostaria. Mas eu aprendo tanto e no próximo eu aplico os aprendizados e faço as coisas de uma forma mais eficiente e funcional. É um hobby que me ensina sobre a própria vida.

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